Dealema revisita os nossos ouvidos com o trabalho “Arte de Viver”. Distribuído gratuitamente através da plataforma Optimus Discos, este EP assinala e reforça, novamente, toda a importância do pentágono na nossa cultura Hip Hop. Maze, Fuse, Mundo, Ex-Peão e DJ Guze enriquecem-nos, mais uma vez, com a sua música. Desta feita, à borla!
«Arte de Viver» é um emaranhado de soturnos, brutais e estranhos ambientes donde pingam pequenas luzes que contribuem para a natural e vital respiração do Homem. Com o planeta debatendo-se com graves cancros e amputações, Dealema palpa o terreno e agita as mentes para a descoberta do remédio que nos salve. Da parte do colectivo dealemático, o antibiótico é a prescrição do costume: lutadores permanentes, eternos sonhadores e caçadores de emoções, nutridos com cantis de liberdade e criação.
Num mundo onde, mais tarde ou mais cedo, tudo é perda, Dealema orgulha-se em potenciar os ganhos. Desde 1993 em actividade, é perfeitamente compreensível que as transformações e o virar das folhas do calendário lhes tragam a percepção de que o sentimento característico da velha escola fique preso nas esferas do tempo. Mas em vez de ficarem agarrados ao passado, os cinco profetas mergulham no mar ainda inexplorado, pisam a terra ainda intacta, gravitam na lua onde ainda não se levantou poeira.
Esmiuçar a vida, o mundo, as pessoas, os confins do mistério, eis a proposta. Observar o que nos escapa à vista desarmada. Sentir e degustar os climas chuvosos, nublados, enigmáticos, tenebrosos, que não permitem antever o que está para lá da cortina de fumo. Ouvir os tique-taques sinistros, os risinhos fantasmagóricos, os recados blindados ao entendimento humano das forças do além. Vamos no comboio-fantasma até à casinha dos horrores. Somos passageiros no próprio mundo, pois claro.
Viver é a confrontação do real que imaginamos com a ficção que somos. Duramos pouco mais do que uma película de terror e, no entanto, sentimos a dor em potência máxima. Quando chega o carro fúnebre? Trivialidade da vida que nega o reconhecimento. Indigência que, no fim, arrasta o corpo para um só e tão apertado buraco. Depressão, degradação, suicídio. Qual o poeta maldito que nunca consumou isto? Histórias de comprimidos por goelas abaixo, de problemas que rasgam peles, de conflitos interiores que dinamitam crânios, de pobreza humana que assalta e viola o próprio corpo. Abaixamento de braços, apertos no coração, olhares absortos e cheiros a pólvora queimada.
É difícil encontrar esperança quando se tem de resistir ao «magnetismo pelo abismo». Mas ela existe. A cabeça erguida é a sina dos guerreiros. O mais justo prémio. Avança-se contra tudo e contra todos, o que importa é mesmo a honra. O Apocalipse não há-de assustar os de bons instintos, nem que venham os corvos agoirar. Como pode a causa ser perdida se pequenas manifestações de vida se agigantam perante a morte? No meio do caos também se operam milagres, é verdade.
Vidas que se cruzam em seis (sete?) graus de separação. Relatos marados. Malícia no abrir das portas. Dentes que rangem com o adeus do crepúsculo. Pesadelos até à alvorada. Bruxas, psicólogos, coveiros, a tratar da sociedade anónima. Viagem ao subconsciente, estados de transe, arrastamentos de pedras tumulares, ressurreições. Sonambulismo e hipnose, com adornos de lividez. «Erosão da sanidade» que faz a ponte para o desconhecido. Visões de hospitais, flashes do inferno, levitações, suspensão do tempo. Anjos e demónios. Como não ficar com “olhos de vidro” (e com ar de rock) quando se entra em dicotomia: vida e morte, beleza e fealdade, resistência e desistência, opulência e miséria, fortaleza e fragilidade, princípio e fim?! Impossível. «Arte de Viver» compreende tudo isto... E o mais que não se pode dizer... É só ouvir.
Dealema ensaiou no seu laboratório sonoro uma série de experimentações e interessantes abordagens que tiveram resultados entusiasmantes. Os relatos da vida, do surreal, dos sonhos, dos simples pensamentos a olhares fogueados no autocarro, enfim, os sentimentos que nos atravessam a espinha e brotam faiscantes no pensamento. O grupo expressou os constrangimentos e os dilemas que são colocados às pessoas, que têm de escolher e arcar com as consequências disso neste mundo cão. Não obstante toda a acidez presente neste EP, o sumo musical daqui espremido servirá certamente para fortalecer o organismo do nosso Hip Hop. Em «Arte de Viver», deixo um reparo apenas para o tema “Mais Uma Sessão” que, não sendo mau, antes pelo contrário, aparece, no entanto, a destoar na linhagem, no fio condutor, de grande parte do EP. Nessa faixa três, Dealema aperalta-se, alista-se na equipa do Rocky e distribui elegantes murros a quem ousar meter-se no ringue poético para confrontá-los. Todavia, não é por este erro de casting que Dealema vê obliterada a magia, a originalidade e a qualidade lírica e instrumental patenteada em toda a “Arte de Viver”. Pena somente para o facto de Dealema ter perdido uma bela oportunidade de apresentar um trabalho verdadeiramente temático e conceptual, escapando um pouco à simples e rotineira compilação de sons.
«Arte de Viver» é um emaranhado de soturnos, brutais e estranhos ambientes donde pingam pequenas luzes que contribuem para a natural e vital respiração do Homem. Com o planeta debatendo-se com graves cancros e amputações, Dealema palpa o terreno e agita as mentes para a descoberta do remédio que nos salve. Da parte do colectivo dealemático, o antibiótico é a prescrição do costume: lutadores permanentes, eternos sonhadores e caçadores de emoções, nutridos com cantis de liberdade e criação.
Num mundo onde, mais tarde ou mais cedo, tudo é perda, Dealema orgulha-se em potenciar os ganhos. Desde 1993 em actividade, é perfeitamente compreensível que as transformações e o virar das folhas do calendário lhes tragam a percepção de que o sentimento característico da velha escola fique preso nas esferas do tempo. Mas em vez de ficarem agarrados ao passado, os cinco profetas mergulham no mar ainda inexplorado, pisam a terra ainda intacta, gravitam na lua onde ainda não se levantou poeira.
Esmiuçar a vida, o mundo, as pessoas, os confins do mistério, eis a proposta. Observar o que nos escapa à vista desarmada. Sentir e degustar os climas chuvosos, nublados, enigmáticos, tenebrosos, que não permitem antever o que está para lá da cortina de fumo. Ouvir os tique-taques sinistros, os risinhos fantasmagóricos, os recados blindados ao entendimento humano das forças do além. Vamos no comboio-fantasma até à casinha dos horrores. Somos passageiros no próprio mundo, pois claro.
Viver é a confrontação do real que imaginamos com a ficção que somos. Duramos pouco mais do que uma película de terror e, no entanto, sentimos a dor em potência máxima. Quando chega o carro fúnebre? Trivialidade da vida que nega o reconhecimento. Indigência que, no fim, arrasta o corpo para um só e tão apertado buraco. Depressão, degradação, suicídio. Qual o poeta maldito que nunca consumou isto? Histórias de comprimidos por goelas abaixo, de problemas que rasgam peles, de conflitos interiores que dinamitam crânios, de pobreza humana que assalta e viola o próprio corpo. Abaixamento de braços, apertos no coração, olhares absortos e cheiros a pólvora queimada.
É difícil encontrar esperança quando se tem de resistir ao «magnetismo pelo abismo». Mas ela existe. A cabeça erguida é a sina dos guerreiros. O mais justo prémio. Avança-se contra tudo e contra todos, o que importa é mesmo a honra. O Apocalipse não há-de assustar os de bons instintos, nem que venham os corvos agoirar. Como pode a causa ser perdida se pequenas manifestações de vida se agigantam perante a morte? No meio do caos também se operam milagres, é verdade.
Vidas que se cruzam em seis (sete?) graus de separação. Relatos marados. Malícia no abrir das portas. Dentes que rangem com o adeus do crepúsculo. Pesadelos até à alvorada. Bruxas, psicólogos, coveiros, a tratar da sociedade anónima. Viagem ao subconsciente, estados de transe, arrastamentos de pedras tumulares, ressurreições. Sonambulismo e hipnose, com adornos de lividez. «Erosão da sanidade» que faz a ponte para o desconhecido. Visões de hospitais, flashes do inferno, levitações, suspensão do tempo. Anjos e demónios. Como não ficar com “olhos de vidro” (e com ar de rock) quando se entra em dicotomia: vida e morte, beleza e fealdade, resistência e desistência, opulência e miséria, fortaleza e fragilidade, princípio e fim?! Impossível. «Arte de Viver» compreende tudo isto... E o mais que não se pode dizer... É só ouvir.
Dealema ensaiou no seu laboratório sonoro uma série de experimentações e interessantes abordagens que tiveram resultados entusiasmantes. Os relatos da vida, do surreal, dos sonhos, dos simples pensamentos a olhares fogueados no autocarro, enfim, os sentimentos que nos atravessam a espinha e brotam faiscantes no pensamento. O grupo expressou os constrangimentos e os dilemas que são colocados às pessoas, que têm de escolher e arcar com as consequências disso neste mundo cão. Não obstante toda a acidez presente neste EP, o sumo musical daqui espremido servirá certamente para fortalecer o organismo do nosso Hip Hop. Em «Arte de Viver», deixo um reparo apenas para o tema “Mais Uma Sessão” que, não sendo mau, antes pelo contrário, aparece, no entanto, a destoar na linhagem, no fio condutor, de grande parte do EP. Nessa faixa três, Dealema aperalta-se, alista-se na equipa do Rocky e distribui elegantes murros a quem ousar meter-se no ringue poético para confrontá-los. Todavia, não é por este erro de casting que Dealema vê obliterada a magia, a originalidade e a qualidade lírica e instrumental patenteada em toda a “Arte de Viver”. Pena somente para o facto de Dealema ter perdido uma bela oportunidade de apresentar um trabalho verdadeiramente temático e conceptual, escapando um pouco à simples e rotineira compilação de sons.
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