sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Dizzy - Mixtape "Mais Uma Fase" (Crítica)

Recentemente, Dizzy ofereceu mais uma mixtape ao Hip Hop Nacional. Depois da “1ª Fase” (EP brotado em Dezembro de 2008), o MC oriundo de Freamunde contempla-nos com mais seis nacos de rimas, distribuídos e alicerçados por meia dúzia de beats, resgatados a Mobb Deep, DJ Premier ou Just Blaze, por exemplo. Com uma maturidade por demais evidente, de quem conhece bem o solo que pisa, Dizzy revela a necessidade constante de elaborar um rap consciente e altruísta.

E é amparado numa batida poderosíssima que Dizzy sobe ao palco e cospe as primeiras palavras à plateia: “Sejam Bem-Vindos”. É o início do show, dos malabarismos vocais, das linhas agressivas e do sotaque nortenho cravado na voz grave que põe em sentido qualquer microfone. “Vamos partilhar bons momentos”, sossega o rapper. Dizzy é um artista em ascensão no rap tuga. A sua postura segura e assertividade a rimar são virtudes que jogam a seu favor. A facilidade com que brinca com as palavras é evidente, o desdobramento dos versos natural: “Aqui faz-se magia/rimas saiem-me da cartola”.

Mas nem todos os momentos contemplam a diversão. A chegada da faixa homónima da mixtape “Mais Uma Fase” é o espelho disso mesmo. Sempre consciente de que a música, e nomeadamente o rap, constitui uma poderosa arma de comunicação, o rapper não poupa munições quando estas estão carregadas de positividade. “Constrói a tua base/ tens um futuro pela frente”. Isto apesar do quotidiano que teima em ser chato, monótono, por vezes madrasto, outras vezes melancólico. E o que fazer para combater o tédio da rotina diária? Para Dizzy, à semelhança de muitos escritores, a caneta é o joker dessas horas: “Quando escrevo liberto toda a energia/ Confissões, ilações que tiro do dia a dia”.

Neste filme, que dá por nome de vida, a esperança pode estar onde menos se espera. O bom actor é aquele que consegue resgatar forças onde elas aparentemente não vagueiam. O mau é aquele que fracassa na luta pela sua “Força Interior”. “Não te deixes ir abaixo, quebra o enguiço/ apenas tu tens a porção para anular esse feitiço”. Os cerca de 3 minutos da faixa são assim preenchidos, com palavras de ânimo. Encontramo-nos num dos picos do show, onde se saúda o emparelhamento com Vírus Mental (seu parceiro no grupo Som Mudo juntamente com Marta Dias) e os electrões positivos que as rimas deste libertam.

Dizzy volta a reclamar as atenções para si com “Procura Equilíbrio”, uma espécie de seu testemunho dos momentos em que as luzes do palco da vida lhe parecem fugir. Mais uma vez, é sustentado que é fundamental o equilíbrio mental na procura dos holofotes do bem-estar pessoal, quando estes se desvanecem num negrume. E se não se avistam então a dor surge. Para Dizzy, essa “dor existe porque de seguida vem o prazer”. As suas palavras introspectivas transpiram uma certa mágoa, mas também alguns laivos de esperança. Depreende-se (e compreende-se) das suas letras que a sobrevivência no inferno depende de cada um, pois o bom doseamento da “paz, amor e união sempre em grande proporção” poderá ser a escapatória para o paraíso. Aliada a uma mensagem tão espiritual e reflexiva como esta, a voz gutural e deveras pungente de Dizzy facilita a transmissão dessa mesma mensagem. Talvez por isso esta ser uma das malhas em evidência na mixtape. Contudo, dizer que estas três faixas que se seguiram podem tornar o passeio por esta obra um bocado cansativo e monótono (pese embora a qualidade do guia), isto tendo em conta que se percorre uma trilha de apenas seis paragens.


No bater da penúltima música, eis que Dizzy chama ao palco o segundo convidado: Hades (Dialecto Verbal). Formada esta dupla de “Pesos Pesados” (como se denominam), o espectáculo ganha duplo fôlego em cima de um beat em chamas (e marcadamente americano, diga-se). Se quando segura no microfone Dizzy pega fogo, Hades activa com a voz o botão de detonação. Carregados de uma confiança inabalável, juntos minam o palco com artefatos explosivos, provando que a escrita e o flow estão mais do que aprimorados.

Sem direito a encore, o alinhamento está quase todo percorrido, não sem antes Dizzy encerrar com chave de ouro. Abre-se a porta da curiosidade quando sai de lá Mundo (o carismático elemento Dealemático) para enriquecer o pacote de “Bárbaros”. Uma das particularidades que salta sempre à vista - neste caso ao ouvido - na voz agressiva de Dizzy é a extrema semelhança com a agressiva voz de Mundo. Quem ouvir pela primeira vez o rapper de Freamunde sentirá por certo uma sensação estranha. E não é só o tom vocal que é semelhante. A influência de Mundo no rap de Dizzy é notória. Para alguns será excessiva, para outros nem tanto. O que é certo é que a fusão das suas cordas vocais faz transcender a faixa. “Neste rap já vi de tudo: B-Boys pernetas, DJ’s sem talento,Writters manetas, MC’s fora de tempo”, dispara Dizzy. “(...) não há tréguas enquanto viveres nas trevas, continuamos submersos como as Vinte Mil Léguas" - é um dos tiros de Mundo Segundo.

Quem já teve o prazer de testemunhar anteriormente o rap de Dizzy (a solo ou em grupo), não ficará surpreendido com as suas rimas austeras e predominantemente introspectivas, embora sempre bastante lúcidas. Quem ainda não tinha sintonizado este mestre de cerimónias, tem nesta mixtape uma boa oportunidade para o fazer. Não superando, na minha opinião, o seu EP, consegue, no entanto, verter todo o gozo com que Dizzy rima, de forma metódica e sem complexos, mantendo-se insubmisso a certos padrões ou estereótipos. Deste modo, já com alguns anos na cena underground, mas (certamente) com muitos outros para coleccionar, o trajecto de Dizzy parece estar longe do seu término, tendo agora sido desbravada apenas “Mais Uma Fase”.

2 comentários:

  1. Es grande mano;) abraçao
    Ass. Andre Leao

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  2. Mano, muitos parabéns..."Mais uma fase"..a partir, de muitas que virão.
    Um grande abraço.

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